21/12/14

Neil Young - I


Neil Young, nascido em 1945 no Canadá, encontra-se por esta altura entre os mais destacados e influentes compositores e intérpretes contemporâneos, ocupando um lugar verdadeiramente único no panorama musical popular, pela maneira liberta e multifacetada como se movimenta entre os universos Folk, Country, e Rock - e também entre os registos instrumentais acústico e eléctrico. Não é apenas que Young faça a aproximação ou reunião entre estes géneros de forma natural, é também que seja um autor destacado em cada um deles individualmente.

Young é facilmente reconhecível pelo estilo/sonoridade que debita da sua guitarra eléctrica, mas é reconhecível, antes de tudo, pela voz característica que nada mudou ao longo de quase 50 anos de carreira - uma voz que aparenta fragilidade e sensibilidade, com tendência de opção pelas regiões agudas (o que a torna particularmente pungente em temas sentimentais), mas flexível o suficiente para se tornar densa e autoritária em temas mais pesados e instrumentalmente preenchidos. Uma voz que não associaríamos de antemão à figura do homem (ou de um homem), mas que cai facilmente na nossa aceitação mal os temas começam tocar. Para além da guitarra, Young recorre com frequência ao uso de uma harmónica e de um piano, instrumentos que enriquecem o leque de soluções ao seu dispor, e por onde também passeia versatilidade e virtuosismo sem aparente esforço.

A sua extensa carreira musical, quer a solo, quer acompanhado pela sua banda de suporte, os Crazy Horse, conta em 2014 com 35 álbuns comercializados (fora os projectos em que colaborou com as bandas Buffalo Springfield - alguém se lembra deste hino? - e Crosby, Stills Nash & Young), está recheada de altos e baixos, de grandes sucessos e de grandes fracassos, foi sempre pautada pela determinação e coragem na procura de novos caminhos, e sempre amparada na necessidade de produzir/concretizar aquilo que a inspiração lhe sugere (a avaliação dos resultados, segundo Young - essa parte - deixa para os outros; a ele só lhe compete produzir). É frequente encontrarmos faixas que excedem os 7 e 8 minutos de duração nos seus álbuns (em Sleeps with Angels há um registo que ultrapassa os 14 minutos, e em  Psychedelic Pill outro que chega aos 27...!) - Young nunca se sentou à sombra do sucesso alcançado, tendo optado conscientemente por não estagnar no tempo, mesmo quando o seu génio criativo ditou um afastamento em relação ao público e à crítica, ou um corte radical face àquilo que havia produzido anteriormente. Neste aspecto, os anos 80 foram particularmente penalizadores e ingratos para com a faceta mais experimentalista de Young, uma travessia do deserto de quase 10 anos, e outros tantos registos considerados menores, iniciada após aquele que é o trabalho central definidor do seu percurso, e provavelmente seu melhor álbum de originais, Rust Never Sleeps, de 1979. Dá-se nele o encontro entre Country e Rock, entre acústico e eléctrico, entre o autor e o intérprete, entre artista e audiência, num jogo de afastamentos e aproximações entre elementos (nas suas palavras: «Out of the blue... Into the black») que tem tanto de conceptual como de vital/intrínseco e definidor para Young, o criador enquanto homem que interpreta o mundo... e o sonhador. É um álbum de originais, mas foi gravado ao vivo perante uma plateia, com os Crazy Horse como banda de apoio. Funciona como uma espécie de súmula daquilo que é/foi a sua carreira, e o tema que o inicia, de forma acústica, repete-se depois no final, com algumas pequenas variações na letra, em registo eléctrico, fechando um arco que indica um processo evolutivo, mas sem término à vista.


O álbum Freedom, editado em 1989, marcou a reabilitação artística de Young junto da sua massa de seguidores, um novo ponto de inversão comercial na carreira, e um primeiro sério indício daquilo que viria a revelar-se uma década fulgurante para o músico. Por essa altura começava a despontar em Seattle um novo tipo de sonoridade musical que definiria a primeira metade dos anos 90; bandas como os Nirvana e os Pearl Jam, os dois vértices mais destacados da era Grunge, apontaram Young com uma influência determinante no som que produziam. Young, por seu lado, acolheu este "apadrinhamento público" com entusiasmo, de forma muito natural, algo que não é de espantar, dada a aproximação notória entre a música de cariz experimental que vinha produzindo desde que lançara Rust Never Sleeps, e as influências do Punk na sonoridade do Grunge. Esta tangente entre Young e as bandas de Seattle alcançou o apogeu no álbum Mirror Ball, em 1995, numa associação aos Pearl Jam (sem Eddie Vedder), e já depois do tributo post mortem que o músico canadiano prestou a Kurt Cobain em Sleeps with Angels, de 1994. Os Pearl Jam, jovens à beira dos 30, então no auge da sua força criativa e sucesso comercial, encaixaram sem esforço no modelo intencionado por Young, que dobrava nesse ano os 50, permitindo elevar o "poder de fogo" da instrumentação de apoio para o degrau acima daquilo que os Crazy Horse normalmente lhe permitiam. A energia de uma juventude em plena efervescência a complementar a curiosidade de uma sabedoria confiante, mas ainda atraída pela experimentação. Não resultou na obra-prima que os fãs de ambas as partes eventualmente esperariam, mas saiu um álbum de rock preenchido e intenso, sem momentos mortos, sem abrandamentos no ritmo ou espaços de silêncio, com dinâmica suficiente para "saber a novidade", em que se percebe o entusiasmo da reunião entre os envolvidos. E se Young ganhou dos Pearl Jam uma muralha cerrada de som à sua volta, a banda de Seattle ganhou por sua vez uma estrutura e uma coerência que não lhes encontramos em mais nenhum álbum, pré ou pós Mirror Ball. É um dos marcos na carreira de Young.

Em 1992, em sentido contrário à corrente de descargas eléctricas, distorção e rock pesado que definiu os álbums de Young desse período, surge a serenidade acústica de Harvest Moon, o sucessor espiritual de Harvest, e um  retorno do músico a um registo Folk e Country que não se lhe ouvia desde quase há uma década. Harvest Moon é um disco composto maioritariamente por baladas nostálgicas, e tem na sua primeira metade alguns dos melhores temas acústicos interpretados por Young.

Para quem não conhece o trabalho de Neil Young, e dada a diversidade e extensão do seu reportório, importa destacar ainda três álbuns míticos, gravados todos em sequência, na fase inicial da sua carreira, e porventura aqueles que contribuíram de forma mais decisiva para a sua revelação e afirmação no meio: Everybody Knows This Is Nowhere (com os Crazy Horse - 1969)After the Gold Rush (1970) e Harvest (1972). É deles também que vou escolher alguns dos temas a apresentar de seguida - nesta mensagem caberão 4 temas "acústicos", e na seguinte mais 4 temas "eléctricos". Não são suficientes para abarcar/revelar Young no seu conjunto como desejaria, mas representam um bom primeiro princípio orientador, ou assim o espero.


After the Gold Rush, do álbum homónimo - 1970



Old Man, do álbum Harvest - 1972


Sail Away, do álbum Rust Never Sleeps - 1979

From Hank to Hendrix, do álbum Harvest Moon - 1992

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