Mais do que a investida vitoriosa das tropas rebeldes de Garibaldi através da Sicília, é a súbita aparição de uma mulher desconhecida, Angelica (Claudia Cardinale), que anuncia a inevitabilidade da mudança para a família de Don Fabrizio, Príncipe de Salina (Burt Lancaster). Uma "mudança que é necessária para que tudo possa ficar como está" - tal como na política, no seio familiar aristocrático é essencial uma "renovação de hábitos" para que o brazão subsista.
A chegada de Angelica e, antes de si, a entrada do seu pai, vêm perturbar (e alterar para sempre) a harmonia cúmplice no seio daquela família. Por entre sorrisos que se desvanecem e outros que se formam, a sala ajoelha-se aos pés de Angelica. As confidências terão de contar com novos interlocutores daí em diante.
Para Fabrizio, o homem que é uma família, avizinha-se o fecho de um
ciclo - um ciclo próspero de influência e domínio que se vinha extinguindo aos poucos - mas o surgimento de Angelica, um delicado(?) anjo exterminador, afigura-se-lhe também como uma saída de continuidade.
Em Il Gattopardo - O Leopardo (1963), adaptação sumptuosa de Luchino Visconti a partir do romance homónimo cunhado por Giuseppe Tomasi di Lampedusa, retrata-se um ponto de transição, um período de guerra civil e fortes convulsões sociais, a tentativa de afogamento de um regime decrépito, a unificação de uma nação pela força das armas, e em simultâneo a extinção de uma certa aristocracia conservadora, mantida à tona por força de uma honrosa linha ancestral, mas digna e respeitada pelas classes mais baixas. Tudo nos é mostrado através do olhar de Fabrízio - uma chama cintilante que vai perdendo pouco-a-pouco a intensidade, capaz de abraçar uma "(r)evolução" que considera essencial, mas sem a resiliência suficiente para continuar ele próprio a servir de farol. Tancredi (Alan Deloin) é o sobrinho que ama e em quem deposita a esperança de um continuidade familiar segura - a troco de um preço elevado...
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